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Homem-Formiga e a Vespa

Homem-Formiga e a Vespa

Matheus Fiore - 29 de junho de 2018

A Marvel Studios se notabilizou pela capacidade de fazer filmes com o mínimo de risco possível. Em sua maioria, as obras mantêm sempre um mesmo estilo de humor, construído por meio de piadas “escadinha” e sacadinhas engraçadas dos personagens. Resta, portanto, pouco espaço para pretensões dramáticas mais interessantes – “Guerra Infinita” é um dos poucos exemplares recentes que se sobressai dramaticamente. Nem sempre, porém, o humor enlatado se torna um problema. Filmes como “Guardiões da Galáxia” e “Homem-Formiga” são exemplares de filmes que, diferente da maioria do universo do estúdio, assumem a comédia, sem fingir que são algo além disso. Em outras palavras, são “sessões da tarde” puras e diretas.

“Homem-Formiga e a Vespa”, continuação do primeiro filme do herói inseto, segue o caminho de seu antecessor. Temos uma comédia que apresenta uma trama simples e coesa – principalmente por conectar-se diretamente aos arcos dramáticos criados no primeiro longa –, e permite que o drama e a aventura sejam apenas nuances em uma obra divertida e despretensiosa.

A direção está, novamente, nas mãos de Peyton Reed, que agora apresenta um trabalho muito menos parecido com o projeto inicial de Edgar Wright – o britânico chegou a dirigir algumas cenas do filme de 2015, mas abandonou o projeto por diferenças criativas. É interessante notar como a Marvel parece absorver o estilo de humor de “Deadpool”, o que demonstra não só o interesse do estúdio de manter sua engrenagem girando, mas também aprender com os concorrentes.

Piadas que fazem referência ao próprio roteiro e debocham de elementos da narrativa são uma constante em “Homem-Formiga e a Vespa”. Se em “Deadpool” o protagonista vê uma solução simples e diz “isso é escrita preguiçosa”, em “Homem-Formiga” o protagonista ironiza o fato de os personagens cientistas colocarem a palavra “quântico” em tudo, apenas para passar algum ar “científico” para as conversas.

Apesar de ter a Vespa no nome, a obra tem um claro foco nos personagens Hank Pym (Michael Douglas) e Scott Lang (Paul Rudd) – respectivamente, o Homem-Formiga clássico e aposentado e o herói que veste a roupa nos dias atuais. Cada um possui sua própria jornada pessoal: o primeiro se sente culpado por não conseguir encontrar sua esposa, Janet (Michelle Pfeiffer), perdida em uma dimensão microscópica há trinta anos; o segundo, ainda em prisão-domiciliar após os eventos de “Capitão América: Guerra Civil”, precisa ser um pai responsável e reconquistar a confiança dos colegas, perdida após roubar o uniforme de herói.

Quando trabalha o conflito de Hank Pym, o filme é bem sucedido, já que toda a trama gira em torno da missão dos heróis para resgatar Janes, a esposa do cientista. Nota-se um esforço enorme do roteiro para mastigar as informações relacionadas à tal “realidade quântica”, o que visa a não só deixar o plot bem explicado, como cimentar o caminho entre “Vingadores 3” e “4”, que certamente utilizarão dos conceitos apresentados aqui para resolver as pendências do filme lançado em abril.

Já a jornada de Scott Lang não tem a mesma felicidade. Apesar de Paul Rudd se esforçar para ser um dos pilares do humor do filme, algo notável pelas caras e bocas que ele emprega no personagem quando brinca com a filha, ele acaba sendo peça secundária em momentos importantes do filme. Há uma forte sensação de que o personagem não está saindo do lugar, justamente pelo fato de o roteiro sempre o colocar em acontecimentos nos quais ele herói precisa reagir, e não agir – algo condizente com um coadjuvante, não um protagonista.

Voltando ao fato de o roteiro não se levar tão a sério, também é curioso como os acontecimentos do filme não ocorrem com um planejamento linear. Há sempre um plano que precisa ser reescrito devido aos acontecimentos da trama – há uma “corrida” pela posse de uma mala tecnológica que move três frentes: os heróis, a misteriosa vilã fantasmagórica e um milionário do submundo do crime que quer lucrar com a tecnologia de Pym.

Há, portanto, uma constante batalha pela posse da mala (que na verdade, é o laboratório de Pym, reduzido por meio da tecnologia criada pelo próprio cientista). Essa disputa faz o plot reescrever seus rumos diversas vezes, o que não só rende inúmeras situações cômicas, como também torna o filme, como um todo, mais engraçado, pelos óbvios elementos de comédia atrelados à constante mudança de planos dos personagens.

Um dos pontos altos do humor do filme é a forma como ele utiliza os poderes dos heróis para criar situações e soluções engraçadas. O Homem-Formiga e a Vespa possuem armas capazes de reduzir ou aumentar o tamanho de objetos, o que permite que um saleiro se torne um muro, um porta-balas da Hello Kitty se torne uma arma, e um carro seja compactado ao ponto de caber em uma maleta. O mais incrível em relação a esses elementos é a forma como os personagens reagem a eles: não há estranheza ou espanto. Com isso, não só o humor ganha pela seriedade com que elementos fantasiosos são encarados, mas também o filme se torna mais parecido com um quadrinho.

A escolha por um humor tão dominante, porém, tem seu preço. Quando tenta criar um investimento emocional, “Homem-Formiga e a Vespa” pouco consegue. A obra aposta, em seu terceiro ato, no relacionamento entre Hank Pym e sua família, mas não há cenas ao longo da trama que desenvolvam esse relacionamento – até a ferramenta mais óbvia, como o flashback, poderia ser útil nesse aspecto. Há apenas a cena que abre o filme, que já havia sido mostrada no primeiro filme, e um sonho de um personagem.

Sem ter qualquer potencial para envolver seu espectador emocionalmente, “Homem-Formiga e a Vespa” é, assim como boa parte dos filmes da Marvel, um blockbuster tão divertido quanto esquecível. Uma obra engraçada, que consegue ainda trabalhar piadas a longo prazo (há elementos inseridos nos dois primeiros atos e que são concluídos ou transformados em piada no terceiro), mas que está destinada à Sessão da Tarde.

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