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Black Mirror 3×06 – Odiados Pela Nação

Black Mirror 3×06 – Odiados Pela Nação

Matheus Fiore - 25 de outubro de 2016

Odiados Pela Nação acompanha a dupla de detetives Karin e Blue, que tentam desvendar a ligação entre duas mortes e a perseguição que as vítimas sofreram nas redes sociais na semana do crime. Em mais uma tacada certeira, Charlie Brooker aqui retrata o discurso de ódio inconsequente das redes sociais e ainda aproveita para construir camadas menores com sutis referências à problemas ambientais e governamentais.

A história é conduzida de forma muito competente pela direção de James Hawes, que dá um bem-vindo tom policial no primeiro ato e, com auxílio do design de som, cria tensão e transforma o segundo ato num suspense com leves toques de horror. O desenvolvimento dos personagens é natural e a química entre a dupla de detetives protagonista é bem estabelecida em poucos diálogos. Mérito também das boas atuações de Kelly MacDonald e Faye Marsay.

Apesar de sua qualidade narrativa, Odiados Pela Nação encontra problemas no roteiro. Uma pequena cena inserida ainda no começo do episódio escancara algo que deveria ser um mistério posteriormente.  Quando um elemento totalmente alheio à cena é destacado com uso de slow motion, não é difícil prever que este exercerá alguma função no desenrolar da trama.

Há também problemas do roteiro no ato final do episódio. A fim de inserir um grupo de personagens em uma situação específica,  o script força uma atitude de um dos policias que é totalmente aleatória e desconexa, tornando o momento infantil e óbvio, assim como a inserção do elemento do primeiro ato.

Por outro lado, os temas abordados são muito bem explorados. A forma como o episódio mostra a sociedade agindo no efeito manada, projetando ódio em uma figura específica de forma inconsequente, é bem apresentada e causa reflexão instantânea. As críticas ao desdém do estado em relação ao bem-estar da população e à obsessão por controle, que chega a desrespeitar a privacidade individual de cada pessoa, também encontram o espaço devido na narrativa.

O capítulo ainda traz outros pecados menores. A falta de foco no primeiro ato torna a temática confusa. Inicialmente somos levados a acreditar que há um problema no relacionamento das duas agentes. Esta sugestão é feita pelas cenas do julgamento posterior à investigação, que apesar de fecharem bem os arcos do episódio, não acrescentam muito à trama. Além disso, a contagem de dias do caso também pode confundir o espectador e não exerce nenhuma função narrativa, sendo abandonada no meio do caminho.

Um dos maiores acertos de Odiados Pela Nação é trazer de volta o que Charlie Brooks fez de melhor nas temporadas anteriores de Black Mirror. Aqui a tecnologia não passa perto do núcleo da trama, funcionando apenas para potencializar e superexpor problemas humanos. O excesso de controle do governo e a facilidade do cidadão comum se mascarar e expor seu real caráter são magnificamente incrementados pelas tecnologias do episódio.

A metáfora mais interessante trazida aqui talvez seja a dos problemas de atitudes inconsequentes do efeito manada. O enxame perseguindo a vítima é uma poética representação física do efeito psicológico da perseguição online que muitas pessoas sofrem ao terem suas vidas expostas na internet. Um detalhe sutil, que pode passar despercebido, mas que mostra a facilidade e inteligência de Brooks de transformar problemas sociais em monstros tecnológicos.

Mais do que o fechamento dessa nova temporada, Odiados Pela Nação é um sinal de mudanças no direcionamento da série. Mas não na temática, claro, apenas no formato, já que este episódio tem a metragem de um filme, com 90 minutos de projeção. Mesmo tendo seus defeitos no roteiro, este episódio é o mais completo da série até aqui, merecendo ser comparado aos fantásticos Natal, Quinze Milhões de Méritos e Volto Já. Só nos resta agradecer pela parceria entre Charlie Brooks e Netflix e torcer não só para que a série continue, mas para que o público entenda suas mensagens.

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