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Planeta Proibido (1956)

Planeta Proibido (1956)

Pioneirismo e marcas do tempo fazem da obra uma viagem pela história do cinema

Matheus Fiore - 16 de fevereiro de 2019

Muito antes de a ficção científica alcançar o auge de sua popularidade em clássicos como “Star Wars”, obras de Byron Haskin, Robert Wise e Fred M. Wilcox trouxeram muito do que viria a ser usado em outros exemplares do gênero; no caso de Wilcox, “Planeta Proibido”, de 1956 foi sua grande contribuição para os sci-fi. O longa-metragem, mesmo que prejudicado por um roteiro expositivo e que muitas vezes faz más escolhas no que tange ao foco dramático – o desenvolvimento dos personagens é posto de lado em prol de um romance frágil e desinteressante –, consegue não só ser um marco para sua época, como também efetivamente retratar a tensão existente após a segunda guerra mundial e a relação humana com as novas tecnologias.

A trama se passa em um futuro distante, e acompanha a chegada de uma tropa interestelar a um planeta misterioso. É uma missão de resgate, e o comandante John J. Adams (Leslie Nielsen) pretende descobrir, juntamente a sua equipe, o que aconteceu com os exploradores da nave Belerephon, que desapareceram sem deixar vestígios. A primeira metade de “Planeta Proibido” aposta em muitas explicações para ambientar o espectador no mundo ao qual adentramos, uma escolha que deixa esse trecho da obra um tanto quanto truncado.

Ao pousar no planeta, o que Adams e sua equipe encontram é um mundo completamente vazio, se não pela presença dos que são, aparentemente, os únicos habitantes: o cientista Edward Morbius (Walter Pidgeon), sua filha, Altaira (Anne Francis), e o robô-assistente Robby. A partir de então, Wilcox constrói um cenário interessante: enquanto Morbius esquiva-se de quaisquer perguntas complexas sobre o que aconteceu no planeta – e tenta ao máximo evitar a ida e, posteriormente, encurtar a estadia dos exploradores no lugar –, a equipe de Adams tenta compreender o que de fato aconteceu. Nisso, conhecemos, lentamente, um pouco sobre os personagens.

Há, desde o primeiro plano, a sugestão de uma presença extra-física no universo do filme. O plano inicial que traz a nave dos exploradores cercada pela escuridão do espaço – imagem que veio a ser utilizada em inúmeras obras de ficção científica ao longo da história, como “Alien: O Oitavo Passageiro”, “Predador” e o próprio “Star Wars” –, é bem acompanhado por uma trilha sonora composta pelo som de um teremim, que cimenta essa estranheza que permeia toda a trama. Os espaços vazios, inclusive, são bem utilizados ao longo da projeção. A cena do pouso no planeta de Morbius, por exemplo, também é brindada pelo teremim, e por apresentar um enorme vazio em volta da espaçonave, também sugere que o perigo ronda o ambiente. Wilcox, portanto, cria em seu filme um universo essencialmente ameaçador e misterioso, algo que impacta em todo o restante da trama.

Os esforços da direção de arte e fotografia para tornar o misterioso planeta um lugar palpável são admiráveis. Se por um lado a ausência de alguma civilização poderia fazer do lugar um ambiente vazio ou falso, as pinturas que criam horizontes profundos são bem utilizadas pela fotografia em cinemascope, que permite um uso caprichado dos amplos cenários para criar uma sensação de isolamento, que é justamente o que Morbius busca em seu exílio. É um planeta vazio, mas não por incapacidade de criação de algo que o preencha, e sim pelo vazio ser a base de toda a ideia do isolamento do cientista proposta por Wilcox.

Apesar de ter John Adams como os olhos do público, Wilcox e o roteirista Cyril Hume mantém como foco da narrativa justamente no enigmático antagonista, Morbius, e na crescente tensão entre ele e os exploradores. Enquanto os patrulheiros espaciais representam as forças da sociedade que tentam levar Morbius de volta para a Terra (ou pelo menos compreender o que aconteceu no lugar), o cientista aos poucos revela-se uma figura pouco interessada em regressar para o modelo de vida tradicional.

É interessante analisar a obra sob o contexto no qual a sociedade da época (especialmente os estadunidenses) viviam. Já mergulhada na Guerra Fria, mas ainda distante da crise dos mísseis, a América e o mundo ainda eram assombrados pelo fantasma de uma guerra nuclear. A trajetória de Morbius, então, permite que a obra faça sutis comentários sobre como o medo dos avanços tecnológicos – principalmente para fins bélicos – se tornou algo presente no imaginário popular.

O conflito entre Morbius e os visitantes permite que haja um choque entre as diferentes visões de mundo. Enquanto para os exploradores, a tecnologia é vista unicamente como algo benéfico e essencial para a manutenção da ordem na sociedade, Morbius, que há muito já vive isolado no planeta, tem uma visão antagônica. O cientista parece crer que a tecnologia é um corruptor da essência humana e, por isso, utiliza seus próprios conhecimentos para manter-se isolado – já que acredita ter sido corrompido.

Apesar de não explorar seu potencial político, “Planeta Proibido” não rejeita um posicionamento, e este é, como esperado, bastante favorável à política bélica americana. Afinal, mesmo com tantas armas poderosas e robôs avançados, o único monstro da obra é criado única e exclusivamente pela projeção mental de Morbius. Wilcox deixa claro que, em seu filme, a tecnologia só é um perigo se em mãos erradas. Como era típico do cinema cafona e em busca de heróis da época, a conclusão não poderia ser outra se não os americanos recuperando a tecnologia – representada por Robby, que viaja com os exploradores para a Terra – para si a fim de manter a ordem.

Mesmo que seja extremamente expositivo por ter um roteiro que aposta em enormes sequências cheias de explicações, “Planeta Proibido” é bem sucedido por três fatores. O primeiro é o fato de o longa conseguir construir um mundo crível, utilizando a união de efeitos práticos e animados para tal, permitindo que o cenário seja um meio termo entre o mundo material e o imaterial – vide o monstro sem corpo que persegue os personagens e a constante sensação de perigo trazida pela trilha sonora. O segundo é a capacidade de falar sobre problemas de sua época sem que haja necessidade de explicitar as analogias ou aprofundar as análises, fazendo com que esses paralelos sejam apenas para contextualização e um sutil posicionamento político. O terceiro, porém, é o que torna “Planeta Proibido” realmente grandioso, que é o fato de a obra conseguir, mesmo com um mundo tão rico e diversificado, conseguir utilizar elementos tão humanos quanto a fragilidade da mente de seu antagonista, como alicerce para criar uma tragédia. É, portanto, um cinema falho e datado, mas também pioneiro.

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