Listas e Especiais

As melhores séries de 2019

Quando não ter vida social foi uma bênção

Redação - 27 de dezembro de 2019

As séries têm uma característica exclusiva em relação aos filmes: o tempo. Se teve gente que reclamou das três horas e meia de “O Irlandês“, é quase impossível ver alguém reclamando de passar 12 horas maratonando uma temporada inteira no fim de semana. E as melhores séries de 2019 capturaram com perfeição esse sentimento de exílio autoimposto, onde cada um de nós pôde se isolar do mundo para embarcar numa história.

Uma curiosidade sobre essa lista: todas as séries mencionadas são novas, um indício de que muita série consolidada se apoiou na fama e perdeu o fôlego. Que o mesmo não aconteça com estas:

5) His Dark Materials: Fronteiras do Universo

Falo com tranquilidade que a HBO (quase) nunca erra em sua adaptações. A série His Dark Materials, adaptada da obra de Phillip Pullman, é mais um desses acertos promissores.

Com uma estética que transcreve para a tela com perfeição a narrativa e o visual dos universos desenvolvidos por Pullman, cada episódio da série é uma viagem ao fantástico mundo de Lyra Belacqua. Além de um elenco cativante, os efeitos usados para materializar os animais falantes permitem que o público mergulhe em um lugar plausível. Ainda que diferente da vida real, discussões sobre relações de poder (entre clero, Estado e forças militares), desigualdades sociais e perseguição a resistências, são discutidas ao longo da realização da profecia que motiva a trama.

Ao fim da temporada a esperança que resta é a de que por ser uma série menor que os livros GoT tudo não se perca.

4) Chernobyl

O gravíssimo acidente numa usina nuclear da Ucrânia em abril de 1986 matou inúmeras pessoas a curto e médio prazo, expondo as fissuras dos sistemas de segurança das usinas soviéticas. “Chernobyl” busca recuperar os fatos e responsáveis por esse acidente, sem poupar os técnicos, burocratas e políticos envolvidos, não apenas para trazer a história recente do mundo para as novas gerações, como também para revelar aos que já eram nascidos naquela época os acontecimentos, personagens e situações às quais o o Ocidente não teve acesso.

A qualidade artística da série tem como destaque principal o total compromisso do criador Craig Mazin e do diretor Johan Renck em serem o mais fieis possível ao terror e à destruição que um acidente nuclear pode causar. Esse compromisso foi abraçado pela equipe de trabalho, que contou com as atuações orgânicas do trio de atores Jared Harris, Stelan Skarsgård e Emily Watson, e a estupenda trilha sonora de Hildur Guðnadóttir, que merece ser admirada até nos créditos finais, caso o espectador tenha estômago para suportar tanta dor e sofrimento.

3) Boneca Russa (Russian Doll)

Natasha Lyonne tem estilo de atuação ao mesmo tempo repetitivo e revigorante. Todo papel interpretado por ela guarda uma semelhança com a Nicky Nichols de “Orange Is The New Black”. Mesmo sua pequena participação em “Ad Astra” faz parecer que Nichols saiu em condicional e conseguiu um emprego em Marte. Talvez seja essa excentricidade que dê às personagens de Lyonne um inegável frescor.

“Boneca Russa” começa da forma mais despretensiosa possível, uma comédia quase absurda. É no desenrolar da temporada que os temas centrais, aqueles que colocam a protagonista nesse ciclo de acordar-viver-morrer-repetir, são trabalhados de forma surpreendentemente densa. A série praticamente abandona o humor no seu terço final, focando no drama humano. Além de Lyonne, destaques positivos são o co-protagonista Charlie Barnett (“Chicago Fire” e “Arrow”) e as coadjuvantes Greta Lee e Elizabeth Ashley.

 

2) Sex Education

Os dramas adolescentes importam. E pior do que as dúvidas naturais sobre a sexualidade, a falta de um lugar seguro para se falar sobre elas é o que mais aflige os jovens. Mas há mais do que sensibilidade temática em “Sex Education”: a série da Netflix tem uma trama se desenvolvendo que usa estes temas para crescer.

Um dos atrativos da série é ter adolescentes como personagens centrais, mas inclui-los em núcleos familiares cuja complexidade fará pessoas de todas as idades se interessarem e se identificarem com suas histórias. A discussão sobre sexo é apenas a ponta do iceberg para diálogos profundos sobre como viver no mundo contemporâneo, onde há muita informação sobre tudo, mas pouca compreensão, de fato.

“Sex Education” vem como um sopro refrescante num tempo de repressão do diálogo sobre sexo em nome de preceitos morais que julgávamos ultrapassados.

 

1) Watchmen

Essa maravilhosa série foi criada por Damon Lindelof a partir dos quadrinhos criados por Alan Moore e David Gibbons na década de 80 do século passado. Trata-se de um trabalho de muitos acertos, e um deles é a perfeita atualização temática  que mantém o clima apocalíptico dos quadrinhos originais, que no século XXI não mais está centrado numa possível catástrofe nuclear, mas sim na ameaça de genocídio presente em regimes totalitários baseados numa dada supremacia racial.

A mesclagem entre o desenvolvimento tecnológico e a questão mais importante da política mundial, que é o racismo e seus efeitos nefastos sobre as sociedades, foi a oportunidade para a criação de protagonistas não-brancos capitaneados por Sister Night (a divina Regina King), herdeira de heróis e elemento central em todas as tramas da temporada. O que para os fãs mais conservadores foi um sacrilégio, na verdade foi uma proposta narrativa ousada, que enriqueceu o que já era excelente nos quadrinhos originais.