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10 Segundos Para Vencer

10 Segundos Para Vencer

Wallace Andrioli - 28 de setembro de 2018

A experiência mais recente de um filme ficcional brasileiro sobre um lutador foi o insuportável “Mais Forte que o Mundo” (2016), de Afonso Poyart, cinebiografia de José Aldo (campeão dos pesos pena do UFC entre 2011 e 2015) com cara de comercial de material esportivo. Portanto, na comparação, “10 Segundos Para Vencer”, que acompanha a trajetória do boxeador Éder Jofre (Daniel de Oliveira), sai ganhando. Afinal, o diretor José Alvarenga Jr. aposta no classicismo ao invés da estilização excessiva de Poyart, ainda que fazendo breves referências visuais a “Touro Indomável” (1980), típico exemplar do cinema moderno de Martin Scorsese.

O principal problema é que Alvarenga Jr. e o roteirista Thomas Stavros não conseguem escapar de realizar um filme muito conservador, na forma e no conteúdo, e triunfalista no tratamento que dispensa a Jofre – os poucos momentos em que o protagonista se comporta de forma negativa se resumem à pouca disposição para os cuidados noturnos com o filho recém-nascido, sobrecarregando sua esposa Cida (Keli Freitas), e ao desânimo após se aposentar da carreira esportiva, que o leva a dormir durante todo o dia. “10 Segundos Para Vencer” acaba sendo a antítese perfeita de “Mais Forte que o Mundo”, logo, tão problemático quanto esse último, que ao menos tem um protagonista emocionalmente intenso, portador de conflitos que movem adiante a narrativa.

Se José Aldo se assemelha, nesse sentido, ao Jake LaMotta de “Touro Indomável”, e Jofre se afasta de ambos, há em “10 Segundos Para Vencer” um personagem que poderia dar a dimensão conflituosa que parece faltar ao filme: Zumbanão (Ricardo Gelli), tio do protagonista e também boxeador (mas absolutamente irresponsável com a própria carreira), que ocupa papel de destaque nos primeiros minutos da história. A frustração que ele carrega (e reprime) pela trajetória esportiva interrompida e por se ver substituído por um parente amado produz uma presença em cena bastante potente, mas frequentemente ignorada pela câmera de Alvarenga Jr. e pelo texto de Stavros. A força dramática que ainda existe no filme se concentra em Osmar Prado, no papel de Kid Jofre, pai e treinador de Eder. Prado encarna em si uma série de estereótipos associados a esse tipo de personagem (turrão, mas amoroso), remetendo, claro, ao (Burgess Meredith) de “Rocky, Um Lutador” (1976) e ao Frankie Dunn (Clint Eastwood) de “Menina de Ouro” (2004). Mas sua atuação tem intensidade suficiente para produzir momentos conflituosos convincentes.

Fora isso, resta seguir por duas horas um protagonista desprovido de contradições, dotado de uma determinação que parece destiná-lo a alcançar o topo. Tudo é uma questão de tempo e a história contada em “10 Segundos Para Vencer” cumpre uma série de etapas para preencher esse tempo até que o auge enfim chegue – para ser sucedido por uma pequena queda (pequena mesmo, já que Jofre jamais decai financeiramente ou perde de fato algum afeto) e uma nova ascensão, responsável por encerrar o filme em momento de triunfo. É quase a concretização em imagem e som de um discurso motivacional banal, desses que regem diferentes mundos na contemporaneidade, do empreendedor ao esportivo. Esforço e disciplina, com um toque de predestinação, levam ao sucesso.

Fosse mais histriônico e menos bem acabado na dramaturgia, “10 Segundos Para Vencer” não se diferenciaria muito de “Nada a Perder”, cinebiografia de Edir Macedo. É verdade que, de certa forma, Scorsese e Paul Schrader (roteirista de “Touro Indomável”) trabalham numa lógica não totalmente diversa dessa, já que sua moral católica condenam LaMotta ao fracasso justamente por não possuir disciplina e ser pouco profissional. Mas o mero fato de biografarem um personagem maldito como esse torna “Touro Indomável” um filme muito mais aberto aos conflitos, à intensidade dramática, à tragédia.

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