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Blue Jay

Blue Jay

Gustavo Pereira - 9 de dezembro de 2016

No mundo pós-moderno, o “viveram felizes para sempre” dos contos de fadas está cada vez mais distante. As trajetórias são tortuosas e, diante da necessidade de seguirmos em frente, muitas vezes não compreendemos plenamente fases de nossas próprias vidas. “Quando a vida decepciona, qual é a solução? Continue a nadar”, já dizia a sábia Dory.

Blue Jay (assista aqui) chama a atenção por se tratar da conversa que gostaríamos de ter, mesmo que não saibamos (ou mesmo tenhamos coragem pra admitir), e ao mesmo tempo nunca teremos. Amanda e Jim, um casal nos tempos de high school, se encontram por acaso em sua antiga cidade na Califórnia. O que começa como um encontro casual se torna num grande fecho para um assunto inacabado entre os dois.

O Jim interpretado por Mark Duplass, que também assina o roteiro (mais do seu trabalho pode ser visto na série Togetherness, da HBO), representa o lado de um relacionamento encerrado que verdadeiramente nunca superou o passado. Duplass é excelente em sua atuação contida de um Jim que busca provar para Amanda que está bem, tentando convencer mais a si mesmo do que a ela. No polo oposto, a Amanda de Sarah Paulson (Studio 60 on the Sunset Strip) passa a confiança de uma pessoa que “deu certo” na vida. O encontro gradualmente desmonta as barreiras de cada um e expõe a verdade sobre como ambos encaram o passado e vivem no presente.

O diretor Alex Lehmann faz um trabalho delicado e discreto para ambientar uma história melancólica. Jim e Amanda se encontram, mas são enquadrados em planos separados mesmo durante diálogos relativamente longos. O tempo e a reaproximação os colocam no mesmo plano, há uma graduação até este momento. A trilha de Julian Wass é usada em momentos de nostalgia, como que embalando sonhos que não viraram realidade. Responsável pela Fotografia, Lehmann fez a opção de rodar o filme em cores e convertê-lo para preto-e-branco na pós-produção. Com isso, há sutis nuances entre o PB total e mínimos pontos de cor (ou mesmo sugestão de cor) em algumas sequências. Ao emular um grande filtro de Instagram, o diretor segue um caminho curioso, mas com uma função narrativa, pois o passado de Jim e Amanda também é marcado por um evento que roubou as cores de suas vidas.

Mesmo próximos, os protagonistas estão separados pelas barreiras que construíram

Eles tentam passar uma imagem diferente de quem são

Até que estas barreiras caem e eles finalmente entram em comunhão

Já no fim, uma insinuação de cores, numa fotografia que parece ter sido lavada 739 vezes: algo existiu ali, mas não existe mais

Não é um filme originalíssimo. Blue Valentine traz um debate similar e Antes do Pôr-do-Sol é infinitamente mais competente na modalidade filmes-baseados-em-diálogos. Blue Jay tem o mérito de nos ligar aos personagens, de ignorar o que cerca cada um para priorizar a dinâmica entre eles. De oferecer aos dois a chance de libertação.

Blue Jay merece ser visto porque nenhum de nós saberia o que fazer se o enredo do filme acontecesse conosco.

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