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Los Lobos

Los Lobos

Longa mexicano estuda a invisibilidade e o isolamento de imigrantes em um espaço que os rejeita

Matheus Fiore - 9 de outubro de 2020

O cinema latino-americano tem um antigo interesse em levar para o cinema a situação dos imigrantes nos Estados Unidos. O argentino Ninguém Está Olhando, de Julia Solomonoff, por exemplo, mostra a dificuldade de um ator para se encaixar no cenário artístico de Nova York sem ser estereotipado como “aquele ator latino”, algo que tanto vemos na indústria. O mexicano Los Lobos, de Samuel Kishi, vai por outro caminho. Um caminho mais observacional, mais denso e mais humano. Acompanhamos a chegada de uma jovem mãe mexicana com seus dois filhos pequenos aos Estados Unidos para tentar uma vida nova na América.

A proposta de Kishi não é exatamente original, mas o cineasta de Guadalajara consegue apresentar ideias que fazem com que seu filme funcione. Há toda uma noção de isolamento espacial que permeia a narrativa. Tanto a mãe Lucia quanto os filhos, Leo e Max, sempre parecem habitar espaços diferentes dos americanos. O próprio quarto em que vivem em Albuquerque, cidade na divisa entre Estados Unidos e México não parece pertencer ao lugar, parece um espaço isolado dos demais lugares ao redor. Essa separação cria uma invisibilidade, uma separação social, deixando a percepção de que aquelas pessoas de fato não são absorvidas ou aceitas pela sociedade.

Os idiomas também são uma ferramenta importante nessa narrativa, já que tanto a mãe quanto os filhos ainda engatinham para aprender o inglês, e a mera dificuldade de comunicar coisas básicas ressalta bastante essa separação cultural. Curiosamente, uma das poucas frases que as crianças dominam é “eu quero ir para a Disney”, o que imprime enorme peso a Los Lobos por simbolizar todo o sonho de sucesso na América sob a perspectiva infantil. A terra dos sonhos e das oportunidades, mas que nunca parece estar de fato pronta ou interessada em receber quem vem de fora.

Sabendo ainda utilizar os olhares e expressões das crianças para retratar o desconforto e a falta de ajuste daquelas pessoas dentro de um mundo inteiramente novo, Kishi ainda merece méritos por jamais explorar o drama de seus personagens de forma humilhante. Afinal, a linha entre o retrato e o “torture porn” é bastante tênue e não é incomum vermos filmes que buscam retratar espaços e distâncias sociais acabarem apenas explorando situações humilhantes – como acontece com o brasileiro Três Verões, por exemplo.

Mesmo com esses méritos, porém, a impressão que passa é que Kishi não tenta tirar Los Lobos de uma zona de conforto muito típica de quando se aborda temas tão populares e complexos. Los Lobos evita os apelos, mas não foge dos clichês. A obra em momento algum oferece algo um pouco mais complexo e acaba por parecer apenas mais um retrato da crise dos imigrantes sob a perspectiva latino-americana. O uso de uma situação tão típica da realidade está lá, bem apresentado e muito bem acompanhado por uma construção de mise-en-scene que nos permite sentir a angustia, o isolamento e a invisibilidade de estar em um ambiente que não nos aceita. Mas, a partir disso, Los Lobos não propõe nenhum aprofundamento, e acaba por, ao longo de 95 minutos, apenas reafirmar seu discurso inicial, sem expandi-lo ou aprofundá-lo, seja com texto ou imagens.


Esse texto faz parte de nossa cobertura para a edição de 2020 do Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba. Para ir até a página principal de nossa cobertura, clique aqui.
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