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Um Céu tão Nublado

Um Céu tão Nublado

A exploração de um país e a procura pelas imagens certas

Júlia Pulvirenti - 14 de outubro de 2021

Quem vai assistir a Um Céu tão Nublado pensando em conhecer histórias sobre pessoas talvez se decepcione. No longa de Álvaro F. Pulpeiro não existem protagonistas, mas sim a relação dessas pessoas com o lugar, a Venezuela. É um filme totalmente espacial, como o próprio nome sugere.

A primeira imagem revela a força de tudo que está por vir. Na escuridão territorial, um fogo ardente que hipnotiza. Vemos uma plataforma de petróleo. O que segue na narrativa são ecos, pequenas faíscas desse fogo. Por esta razão, é negado ao espectador o direito de conhecer os indivíduos que aparecem. Não sabemos seus nomes, seus anseios ou sua opinião política. Eles apenas seguem sua vida com uma câmera ao redor, sempre contrastando com a paisagem. Mesmo assim, conseguimos entender que esses cidadãos constroem a nação. O trabalho manual é constante, seja ele botar as mãos nos barris de petróleo ou trocar câmbio na estrada.

Pode parecer um documentário despreocupado com o povo venezuelano ou “em cima do muro”. No entanto, essa abordagem já diz muito sobre a linguagem do filme e o ponto de vista de seu realizador. Assemelha-se a um experimento em busca das imagens mais condizentes com a atmosfera do país: algo hostil, melancólico e tomado pela exploração. Tanto que nos momentos em que carros seguem pelo chão batido para trabalhar, se escuta discursos políticos, desavenças com os Estados Unidos e alertas de crise, como um rádio trocando de estação.

Quase no final da obra, uma cena muito bonita consegue transmitir a sensação de sufocamento (ou tentativa de respiro). A câmera foca completamente na plataforma de petróleo, com um céu negro ao redor. Então, ela afunda na imensidão do mar, sem conseguir voltar à superfície. Como desfecho, a nação apenas segue. Continuam trabalhando, apesar de tudo. Uma cultura construída por diversas mãos e conflitos complexos demais.


Este texto faz parte da nossa cobertura para a 10ª edição do Olhar de Cinema.
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