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Deuses Americanos 1×07 – A Prayer for Mad Sweeney

Deuses Americanos 1×07 – A Prayer for Mad Sweeney

Gustavo Pereira - 12 de junho de 2017

“A Prayer for Mad Sweeney” é precedido por “A Murder of Gods”. Para ler a crítica do sexto episódio de Deuses Americanos, clique aqui.

É possível considerar este episódio de Deuses Americanos como uma adaptação para a TV da música “Runaround Sue”, de Dion DiMucci, tema de Essie MacGowan (vivida por Emily Browning, a intérprete de Laura Moon), personagem principal da história de Ibis. A associação é direta, pois a letra se refere a uma mulher destruidora de corações, que conquista os homens e depois os abandona. Mas há mais.

Dion é um cantor com duas fases distintas em sua carreira: um ídolo teen nos anos 1950 que foi eclipsado pela invasão do rock britânico nos Estados Unidos, para retornar reconhecido pela crítica como um compositor “maduro” 20 anos depois. Essie é uma criança recém-chegada aos Estados Unidos que, no decorrer da vida, não é tida como muito mais que uma ladra sedutora. Mas, anos após sua desgraça, retorna para ser reconhecida como uma esposa dedicada e uma mãe amorosa. E tanto Dion quando Essie reservavam grande parte de suas vidas ao culto religioso.

Essie MacGowan, quando criança

As principais cores deste quadro são o laranja, o amarelo e o vermelho. Essas cores, por definição, são quentes. Mas o índice de saturação é tão baixo (isto significa que as cores foram “lavadas” com cinza) que estes tons perdem sua função, tornando-se neutros. Sua real natureza fica escondida, assim como Essie se esconde numa vida de pequenos delitos para sobreviver num mundo que a rotulou – injustamente – como ladra.

Essie, agora adulta: a saturação média desta paleta é de apenas 20%

O que esta escolha do cinematógrafo Darran Tiernan representa? Que Essie não é uma personagem “pura”, que foi “neutralizada” pelo seu entorno. Que sua essência, quente e viva, foi perdida por uma existência dura em uma falsa “terra das oportunidades”. Há um contraste cômico entre a parte da narração na qual Ibis conta o que acontecia com quem era despachado para a América com a música que compõe a cena. Um mundo de sonho no qual as pessoas preferem acreditar cegamente, pois encarar os fatos seria perder a última motivação para continuar vivendo. Tal mundo, naturalmente, não reserva espaços para a crença nos Velhos Deuses.

Delicadamente, o mesmo é sugerido sobre Mad Sweeney, que em algum momento do seu passado já foi um deus benevolente, mas se amargurou pelo esquecimento e virou uma espécie de hooligan desbocado. A decisão de colocar Browning interpretando Essie reforça o vínculo que ele agora tem com Laura, sendo irrelevante descobrir se há entre elas algum parentesco (embora fique bastante claro que há). E talvez seja exatamente por isso que Sweeney esteja tão decidido a ajudar Laura e reaver sua moeda. Dois coelhos numa cajadada só (sem incorrer em trocadilhos com o que acontece na parte final do episódio).

Outro elemento muito bem utilizado em “A Prayer for Mad Sweeney” é a transição entre cenas: no exemplo da esquerda, do bocal do telefone para a chegada à América; na direita, da garrafa de cerveja para a Londres do Período Tudor (tanto telefone quanto cerveja podem ser considerados “meios de transporte da consciência”)

“A Prayer for Mad Sweeney” é um episódio absurdamente elegante nas sutilezas: relaciona a protagonista com o cantor de sua música-tema, duas figuras “salvas” por seus deuses, que precisaram ser mais do que resolutos para sobreviver a uma realidade neutralizadora, da qual nem mesmo os próprios deuses estão imunes. De quebra, ainda desenvolve a trama principal e deixa tudo preparado para a season finale de semana que vem. Deuses Americanos deixará saudade.

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