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Nasir

Nasir

Sobrevivendo nas brechas do capitalismo

Matheus Fiore - 8 de outubro de 2020

Um dos temas recorrentes no cinema contemporâneo mundial é a posição do trabalhador no capitalismo. Do sul-coreano oscarizado Parasita à obra-prima brasileira Arábia, os mais variados filmes dos mais diferentes países abordam como o trabalhador é tratado e como vive num mundo em que seu suor e seu corpo são vistos como mera ferramenta de trabalho, visando o lucro e nada mais. Nasir, creditado como filme da Índia e da Holanda, é mais um que aborda a temática, mas com um olhar bastante particular do diretor Arun Karthick.

Com um formato que emula bastante o documental em alguns momentos, Nasir rejeita uma montagem clássica e um desencadeamento de eventos mais ortodoxo. A obra acompanha a rotina de um trabalhador indiano e mostra como, nas brechas entre tarefas, ele sobrevive. O filme de Arun Karthick é bastante contido em suas palavras, e muitas cenas do filme sequer possuem alguma voz além das canções que acompanham as imagens projetadas. Tanto os olhares e expressões dos personagens quanto a força de seus momentos de paz são o que exalam a visão de Karthick para a história que está contando.

A ideia é ser um recorte que fala pelo que o cinema tem de mais forte: a imagem. Um plano detalhe ou um close up que destaquem uma mão, um altar ou um rosto são sempre as imagens centrais da cena, e tudo parece orbitar ao redor disso. Mas entre essas cenas de refúgio, de paz, há o trabalho. Há as cenas deliberadamente maçantes – mesmo que, intencionalmente curtas – que mostram o protagonista fazendo suas atividades profissionais. São cenas nas quais o protocolo profissional e as relações empregatícios se destacam e a câmera parece mais inquieta, justamente para mostrar o desconforto de todo esse cenário. Não por acaso, a câmera muitas vezes se movimenta horizontalmente como se fosse uma câmera de segurança, monitorando o trabalhador.

O que Nasin grita, porém, é como essa parte da vida, na verdade, não importa. Mesmo que seja o que move a sociedade capitalista, o trabalho não é o que move o indivíduo, não é o que alimenta sua alma. Por isso, o carinho do Arun Karthick em filmar cada reza, cada momento de relaxamento de seu protagonista, evidenciando o quão necessárias essas brechas são em sua rotina e o quão grandiosas são as coisas que realmente importam. Portanto, Nasir não deixa de carregar e imprimir certa melancolia em suas imagens, já que evidencia como algo tão pequeno e irrelevante pode ser capaz não só de sufocar nossas vidas, mas de conduzir elas. Mostra como o trabalho pode reduzir pessoas complexas a atividades que existem unicamente para a movimentação econômica.


Esse texto faz parte de nossa cobertura para a edição de 2020 do Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba. Para ir até a página principal de nossa cobertura, clique aqui.

 

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