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A Primeira Noite de um Homem (1967)

A Primeira Noite de um Homem (1967)

Matheus Fiore - 2 de janeiro de 2017

No fim dos anos 60, o público se distanciava muito dos cinemas. As obras já não eram capazes de gerar empatia, o excesso de personagens distantes da realidade americana criou um enorme desinteresse por parte do espectador. Muito inspirada pela Nouvelle Vague, que talvez tenha sido o mais importante movimento cinematográfico da história, veio a Nova Hollywood, que tornou a indústria americana mais focada em filmes com personagens mais humanos. Um dos pioneiros e principais filmes do movimento foi A Primeira Noite de um Homem, de 1967.

Estrelado por um jovem Dustin Hoffman e dirigido por Mike Nichols em apenas seu segundo filme, a obra é um estudo de personagem de um rapaz que acaba de se formar na faculdade e está sem rumo na vida. O primeiro ato do longa foca exclusivamente na construção do entorno do protagonista. A cena que abre o filme, trazendo Benjamin Braddock, o personagem principal, sendo coagido por seus pais a participar da festa com os amigos da família é extremamente claustrofóbica. Acompanhamos Ben sendo conduzido por diferentes conversas com diferentes pessoas enquanto a câmera o segue em planos contínuos em close up, estabelecendo a prisão mental onde o personagem se encontra.

Incapaz de se manifestar e sempre sendo guiado pela vontade dos pais, Ben parece só se identificar com seus peixes. É curioso notar que todo o quarto do rapaz é escuro e enquadrado com inúmeros elementos na tela, criando um ambiente compacto que pressiona o protagonista. O único refúgio do rapaz é seu aquário, e quando fora do quarto, encontra paz justamente em sua piscina, situando o personagem como um “peixe fora d’água”.

A vida de Ben tem uma guinada quando o protagonista estreita seus laços com a Senhora Robinson, uma mulher com o dobro de sua idade que passa a assedia-lo. Enquanto cimenta a impotência e insegurança do personagem, a primeira metade de A Primeira Noite de um Homem constrói a relação destes dois personagens. Ao se aproximar da mulher interpretada por Anne Bancroft, vemos o jovem passar a demonstrar seus impulsos e externar seus sentimentos, transformando completamente o filme.

Em sua segunda metade, o que parecia ser um filme sobre solidão se transforma em um melancólico drama sobre juventude e impulso. Conhecemos as histórias dos personagens adultos ao mesmo tempo que acompanhamos o crescimento dos mais jovens, e é extremamente triste ver que os jovens estão fadados a repetir os erros de seus antecessores. Benjamin agora se aproxima de Elaine, filha da senhora Robinson, mas a impulsividade do protagonista prejudica a relação. Repetidas vezes acompanhamos o personagem reagir à uma situação sem parar para analisa-la  e traçar uma estratégia, o que sempre resulta num problema maior.

Um exemplo perfeito é a cena em que Ben descobre os planos da senhora Robinson para afastá-lo de sua filha, e por não pensar com calma em como resolver a situação, age impulsivamente e proporciona o cenário perfeito para a execução dos planos da potencial sogra e que prejudica seu objetivo. Inteligentemente, o roteiro arquiteta a narrativa para a construção do melancólico clímax. Enquanto o espectador desatento pode vir a pensar que a segunda parte da obra é apenas um romance de conquista, por trás há um forte retrato de uma juventude despreparada e ansiosa.

Em contraponto à situação de parafuso que Ben se insere ao nunca planejar suas atitudes, vemos a libertação do personagem, que passa a agir mais, não só reagir à impulsos externos. Ele passa a impor suas vontades diante das pessoas à sua volta enquanto a direção e a fotografia do filme passam a encaixa-lo mais confortavelmente em cena. O protagonista, que antes era sempre guiado por terceiros e chegava a ser colocado de costas para o centro do quadro, passa a ter o domínio de suas ações e ser inserido em posição superior em relação aos personagens com quem dialoga. A libertação do “peixe fora d’água”, porém, não traz a beleza do amadurecimento que se espera de um caso como esse. Ao conhecermos a história da senhora Robinson, lentamente vemos Ben levar Elaine a repetir os mesmos erros que poderão leva-los à uma vida medíocre e infeliz.

Um dos grandes motivos do sucesso da obra foi sua trilha sonora. O trabalho da dupla Simon & Garfunkel traz uma das mais melancólicas canções do século passado, Sound Of Silence, que ilustra perfeitamente os momentos de solidão e vazio existencial de Benjamin. Há, porém, uma incômoda repetição de temas durante a projeção, que poderia ser trocada por mais canções. A trilha acaba sendo usada mais para suavizar as transições das cenas, sendo um alívio visual e sonoro para o espectador entre os momentos mais dramáticos do filme.

Fechando poeticamente a narrativa, temos um dos finais mais incríveis do cinema americano. Escancarando a falta de profundidade das escolhas do protagonista, a direção de Mike Nichols faz questão de focar no rosto dos personagens por tempo suficiente para que fique nítida a reação deles quando compreendem o que fizeram. Mesmo que inicialmente o público tenha uma impressão, os olhares em volta e, posteriormente, a mudança no semblante dos personagens deixam claro o real resultado das escolhas dos jovens. Resta à eles aguentarem o peso de suas escolhas, e ao espectador, imaginar que estes estão fadados a repetir os erros de seus familiares.

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