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Ser Feliz no Vão

Ser Feliz no Vão

Espaços e representatividade em um Brasil que parece preso no tempo

Matheus Fiore - 19 de julho de 2021

Ser Feliz no Vão é um não raro mas bem feito curta de interesses políticos e sociais bem definidos. A intervenção de seu autor, Lucas Rossi dos Santos, existe apenas na montagem, na justaposição de imagens a fim de criar uma ideia. A pura dialética é formada por sequências como a de Tim Maia falando sobre os negros ocupando espaços e analisando a geografia do Brasil e da África, que é sucedida por um conhecido registro televisivo de jovens brancos da elite fazendo comentários extremamente racistas na praia de Copacabana.

O curta se constrói sobre imagens de arquivo que vão de depoimentos que falem direta ou indiretamente sobre questões raciais ou registros de negros ocupando espaços. É um filme que não demonstra tanta preocupação por uma abordagem direta, apenas projeta diferentes cenários do Brasil para falar sobre racismo e, assim, apresenta-se como uma obra politizada e antirracista. O acerto de Lucas é não fazer questão de sempre trazer depoimentos que reiterem o posicionamento, mas sim deixar as imagens expressarem a ideia naturalmente.

De figuras com importância inquestionável na cultura nacional, como o próprio Tim Maia, a jovens no transporte coletivo, Ser Feliz no Vão está sempre em busca de apresentar a resistência e a ocupação de espaços como uma ferramenta política. Como o curta reitera, a própria existência dos negros é um ato político, visto que, principalmente no Brasil, temos uma sociedade que sempre está segregando e assassinando pessoas de cor de forma tão brutal quanto normalizada. A violência em Ser Feliz no Vão, porém, não se faz presente por relatos ou registros da brutalidade policial ou algo do tipo, apenas pela investigação do dia-a-dia do brasileiro, como a moradora da zona sul do Rio de Janeiro que admite sem pudor, de frente para as câmeras, que tem nojo de pessoas “sem educação” que frequentam seu bairro.

É também notável como Ser Feliz no Vão consegue ser um relato que foge de limitações temporais por sequenciar imagens de diferentes contextos, marcando a terrível sensação de que vivemos em um país que sofre com os mesmos problemas raciais há décadas. Dos negros sendo desumanizados com black face até jovens se preparando para ir à praia, tudo habita um mesmo universo no qual décadas de distanciamento não significam grande progresso. Ser Feliz no Vão é um posicionamento contra o atual estado das coisas e uma constatação da importância de manter-se ativo na luta pela ocupação de espaços diante da resistência do racismo na sociedade contemporânea.


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