Amor e Monstros

Amor e Monstros

Valorizando coisas simples em tempos difíceis

João Oliveira - 21 de abril de 2021

Passado um ano de pandemia da covid-19, é normal que alguns lançamentos recentes abordem este contexto de forma direta ou indireta em suas narrativas. Apesar destes lançamentos, é ainda mais curioso ver que algumas produções anteriores ao período conseguem servir de metáfora para esta conjuntura. É o caso de Amor e Monstros. Produzido em 2019, mas lançado internacionalmente agora, o filme se passa em um mundo pós-apocalíptico onde os seres humanos foram dominados por monstros. Por causa destes seres, a humanidade vive isolada de si, no subsolo, enquanto estas criaturas perambulam livremente pela superfície. Mesmo que a produção não fosse capaz de prever as circunstâncias em que nos encontramos atualmente, o filme acaba servindo como paralelo para este contexto. De certa forma, os monstros se assemelham ao corona vírus, visto que obrigam os humanos a ficarem em locais seguros e isolados uns dos outros.

Joel Dawnson (Dylan O’Brien) é um sobrevivente deste mundo. Com a catástrofe, o jovem que tinha apenas dezesseis anos perdeu sua família e se separou de Aimee (Jessica Henwick), sua namorada, fugindo sozinho para um bunker com desconhecidos. Sete anos se passaram desde que ele viu com seus próprios olhos o cataclismo. Com a esperança de reencontrar sua amada algum dia, ele aguenta solitário a tediosa rotina do subterrâneo enquanto o restante do abrigo tem alguma companhia para chamar de sua. Joel não possui nenhuma qualidade marcante, o rapaz é relegado a função de cozinheiro do grupo por não ter coragem de enfrentar os monstros. Após inúmeras tentativas frustradas de contatar Aimee, Joel finalmente consegue estabelecer uma comunicação via rádio com a base dela. Empolgado com a possibilidade de revê-la, o rapaz decide impulsivamente marchar para o Oeste e viajar os longos quilômetros que separam o casal. Embora não possua o preparo e a coragem necessários para enfrentar as ameaças da superfície, ele considera ser melhor morrer tentando reencontrá-la, do que apodrecer sozinho em um bunker. Assim, o protagonista parte em sua jornada, munido de seu amor incondicional e colocando a teste sua força e coragem.

Amor e Monstros é um filme para jovens adultos sobre amadurecimento. Mesmo com protagonistas adultos, sua premissa infantil e sua encenação pop acabam funcionando por sua narrativa tratar de um amadurecimento tardio. Diferente de muitas distopias pós-apocalípticas, Amor e Monstros não possui um protagonista forte, muito pelo contrário, Joel tem consciência de ser fraco e covarde, tendo em seu amor por Aimee sua única fonte de força. Nesta pegada, o filme segue algo similar ao que Zumbilândia fez com o personagem de Jesse Eisenberg, ainda mais após o encontro de Joel com o sóbrio Clyde (Michael Hooker) e a adorável Minnow (Ariana Greenblatt), seus mentores na superfície, que lembram as personagens de Woody Harrelson e Abigail Breslin, respectivamente. O roteiro de Brian Duffield e Matthew Robinson deixa claro que a jornada de Joel é para encontrar sua força interior e não uma simples missão suicida em busca da mulher amada.

Ironicamente, o filme estabelece um mundo regido pela destruição, mas sua temática principal gira em torno da construção. O percurso de Joel segue os moldes de um videogame, com personagens surgindo e saindo a cada nova etapa. Esses trechos também trazem uma construção de vínculos, enquanto a jornada pessoal do personagem principal gira em torno de se construir coragem para poder amadurecer. Ou seja, a trama principal do filme acaba sendo uma antítese do mundo estabelecido. Ainda sobre esta jornada, é curioso que o destino do protagonista seja o Oeste, acenando para a ideia de Destino Manifesto, mito fundador dos Estados Unidos, que expandiu as colônias americanas até a costa do Oceano Pacífico. Aqui, este Destino Manifesto segue as mesmas pretensões, pois o personagem principal cataloga tudo que passa por seu caminho (como uma lore de um jogo) de modo a ajudar a humanidade a retomar a superfície, seu lugar de direito.

Apesar dos válidos paralelos com a pandemia, seria leviano considerar a travessia do protagonista pela superfície como algo contrário ao lockdown, visto que a produção é anterior a este período. Apesar disso, a direção de Michael Matthews, se atenta em frisar detalhes que apontam o quão belas são as simplicidades da vida ao ar livre. Isso acontece porque o filme tira muitas pausas para admirar pequenos momentos de prazer que o mundo pode proporcionar. Em meio a ameaças magnânimas, parar para admirar a paisagem também tem seu valor. Além disso, o filme enaltece muito a questão de ter uma companhia, presente em momentos como o encontro de Joel com o cachorro Boy ou a primeira vez que o protagonista se depara com uma robô Mav1s funcionando perfeitamente. Estes respiros pontuais e pensados pelo diretor são a alma de Amor e Monstros, fazendo ele deixar de ser um genérico apocalíptico qualquer para mostrar que há coisas para se valorizar mesmo em períodos extremamente difíceis.

Assim, a jornada de Joel é das mais agradáveis possíveis. As referências e a trilha sonora pop incrementam a sensação de feel good movie que o longa metragem busca imprimir. Nesta busca por amadurecimento, o protagonista encontra a sua força através do contato com aqueles que passam pelo seu caminho, mas também por admirar os pequenos detalhes que a vida proporciona. Por isso que seu clímax se resolve quando o rapaz resolve observar as minúcias da situação. Amor e Monstros não é nenhuma obra-prima, mas é aquele tipo de filme que serve para desligar a cabeça e aproveitar a jornada e para isso ele funciona muito bem. Melhor ainda é sua última cena, com uma mensagem esperançosa, que, mesmo feita antes da pandemia, exprime para seu espectador que os momentos difíceis alguma hora irão passar.

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