Terrifier 2

Terrifier 2

Slasher de atrações

Wallace Andrioli - 6 de janeiro de 2023

Ao encerrar Terrifier (2016) com a ressuscitação sobrenatural do palhaço Art (David Howard Thornton), após uma cena de suicídio assustadora e coerente com a proposta do personagem até aquele momento, o diretor, roteirista e montador Damien Leone abriu caminho para essa continuação organizada sobre um terreno mais aberto, desobediente em relação a qualquer tipo de vínculo realista mesmo num gênero afeito à falta de lógica como o horror slasher. E Terrifier 2 se esbalda diante das novas possibilidades que se apresentam.

Art surge aqui como mais que o assassino vestido de palhaço que se esgueirava pela noite em busca de vítimas solitárias no filme anterior. Ainda que o roteiro não explique exatamente a natureza do personagem, se ele sempre teve um pé fora da realidade mundana ou se isso só passou a acontecer após retornar da morte, Art atua em Terrifier 2 como uma entidade imparável e quase onipresente. Derrotá-lo passa a ser, talvez, impossível, mesmo que reste preservada a fisicalidade de seus atos de violência extrema, o que gera mais algumas sequências brutais e sangrentas, capazes de rivalizar com os momentos mais grotescos do primeiro Terrifier. É verdade que Leone chega a esboçar a criação de alguma mitologia em torno dessa figura macabra, mas os elementos apresentados nesse sentido não ganham real destaque e se inserem de maneira frouxa e desleixada no enredo. São, enfim, desimportantes.

No fim das contas, é isso que interessa: criar oportunidades, não necessariamente bem articuladas entre si ou seguindo uma lógica espaço-temporal clara, para Art matar mais pessoas, se possível todas aquelas que aparecem na trama. Terrifier 2 obedece ao princípio do cinema de atrações, adaptado aos códigos do slasher. Um exemplo perfeito disso: em certo ponto da narrativa, o vilão tortura atrozmente a jovem Ellie (Casey Hartnett) em seu quarto, até ser flagrado pela mãe dela; corta para crianças tocando a campainha da casa e sendo recebidas pelo palhaço, que lhes oferece doces diretamente da cabeça decepada da segunda mulher; logo em seguida, Art já vandalizou o carro de uma terceira personagem e aguarda escondido para atacá-la. Outro exemplo: a excelente sequência musical “The Clown Café”, em que a história é interrompida para o diretor se divertir na encenação onírica de uma espécie de programa infantil infernal.

Por fim, Art é em si uma atração, e das mais impactantes. A composição visual assustadora e o gestual expressivo de Thornton, trazido do universo da mímica, fazem do palhaço uma presença incômoda mas estranhamente hipnotizante, já que sua perversidade absoluta é atravessada por um irresistível senso de diversão (do próprio personagem, claro, encarnação do puro mal, sádico e sem limites, do diretor e do público aficionado pelo gênero).

E Terrifier 2 consegue ainda uma pequena proeza: ao mesmo tempo que reitera repetidamente ao longo de mais de duas horas os efeitos marcantes da existência de sua principal e apavorante criação, o que tende a intensificar na plateia o desejo por vê-la mais em ação, pouco se importando com as demais figuras presentes na narrativa, o filme tem uma protagonista, Sienna (Lauren LaVera), pela qual é difícil não torcer, já que dotada de uma força também proveniente dessa lógica da atração. Afinal, por mais que Sienna possua um background dramático básico, Leone se dedica mesmo a gerar expectativa em torno do seu confronto com Art, vestindo-a de super-heroína e lhe dando uma espada de alguma forma mágica. É nesse grande momento que Terrifier 2 quer, enfim, chegar, e sua concretização é de fato prazerosa, tanto pela catarse do que acontece quanto pela preservação do sarcasmo delicioso do palhaço demoníaco até o último instante. O diretor consegue, aqui, fazer jus a ambos os personagens.

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