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Deuses Americanos 2×08 – A Sombra da Lua (season finale)

Deuses Americanos 2×08 – A Sombra da Lua (season finale)

Um episódio final que resume a decepção da segunda temporada

Gustavo Pereira - 1 de maio de 2019

Essa crítica será dividida em duas metades. Na primeira, falarei do episódio “A Sombra da Lua”. Na segunda, sobre a temporada de “Deuses Americanos” como um todo. Não haverá spoilers.

Deuses Americanos American Gods Neil Gaiman temporada 2 A Sombra da Lua Moon Shadow

Quem usa aplicativos de paquera já passou por isso: a pessoa parece encantadora, você marca um encontro… e a coisa simplesmente não flui. O que parecia interessante no bate-papo virtual quase não aparece frente a frente. Novidades não agradam. Voltamos pra casa pensando na noite incrível que imaginamos, mas em nenhum momento passamos perto de ter. Acontece a mesma coisa em “A Sombra da Lua”, o final pra lá de morno da segunda temporada de “Deuses Americanos”.

Tudo pode se resumir a promessa e entrega. Porque o começo do episódio é muito bom. Não apenas pela brincadeira com a proporção da tela. “A Sombra da Lua” tira da cartola um evento real que tem a alma de “Deuses Americanos”. Ao mostrar uma família do interior da Nova Jérsei ouvindo o rádio e se descobrindo vulnerável a uma invasão marciana, a transição da calmaria para o completo pânico acontece sem escalas. O mais interessante é que tal noticiário não passava de uma das maiores “pegadinhas” da História.

Deuses Americanos American Gods Neil Gaiman temporada 2 A Sombra da Lua Moon Shadow

“Deuses Americanos” não menciona, mas os leitores do Plano Aberto estão em boas mãos: estamos falando da releitura de “Guerra dos Mundos” feita por Orson Welles (que três anos depois dirigiria “Cidadão Kane”, um dos melhores filmes de todos os tempos). O texto é maravilhoso. E a ilusão foi tão boa que parte dos ouvintes realmente acreditou que a Terra estava sob ataque. Dessa forma, as consequências do ataque foram reais, mesmo que o ataque em si nunca tenha existido. “Deuses são reais se acredita neles”, não é mesmo?

Por que “A Sombra da Lua” dá errado?

O plano de Mr. World para começar sua guerra é evidente: usar a Mídia para criar pânico. Mas, na hora de mostrar esse pânico, o que acontece é decepcionante. Tanto pelo pouquíssimo tempo dedicado a ele quanto à sua dimensão. É criada uma ilusão (do tipo ruim) de acontecimento, mas as consequências práticas dele são mínimas, para não dizer nulas.

Deuses Americanos American Gods Neil Gaiman temporada 2 A Sombra da Lua Moon Shadow

Shadow Moon, simbolicamente isolado em sua jornada

Quando os eventos de “A Sombra da Lua” são divididos pelo episódio, fica mais evidente o quanto de tempo a série perdeu falando sobre nada. Em fins de temporada, o comum é que todos os arcos sejam resolvidos simultaneamente e o espectador mal consiga respirar. Mas a história avançou tão pouco que há tempo para longos períodos reflexivos de um Shadow Moon melancólico, perdido, macambúzio. Personagens que passaram a temporada inteira servindo de porta-vozes esporádicos de parábolas sobre fé e calvário não parecem ter nenhum propósito narrativo além da própria existência. É quase como se o roteiro não soubesse o que fazer com eles.

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A cena mais icônica deste marasmo é o jogo de xadrez entre Nancy e Ibis. O xadrez é o o jogo mais rico em potencial para analogias sobre a história em que ele existe (veja mais neste vídeo sensacional do “Now You See It”). Aqui, entretanto, meramente indica que os personagens estão em campos ideológicos opostos, mas são igualmente pacientes. Num episódio que começou referenciando “A Guerra dos Mundos”, bem preguiçoso.

A segunda temporada de “Deuses Americanos” decepciona

Além da já mencionada falta de desenvolvimento da trama, esta temporada foi marcada pelo subaproveitamento do elenco. Figuras como as de Ian McShane e Crispin Glover, principalmente o segundo, quase não tiveram oportunidades para desempenhar seus bons trabalhos. O tempo costuma ajudar para aprofundar personagens, mas tanto Odin quanto Mr. World, ao invés disso, se tornaram mais unidimensionais.

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A reação do público ao perceber que a temporada estava acabando e não havia acontecido nada

“Deuses Americanos” teve espasmos esporádicos da grandeza da primeira temporada quando teceu comentários sobre o mundo contemporâneo. O início de “A Sombra da Lua” não deixa de cutucar a sociedade que alçou uma figura como Donald Trump ao cargo mais importante do mundo por medo (de perder empregos, soberania e protagonismo). Em “Os Caminhos dos Mortos“, usou a história de um negro para traçar o panorama de todos os negros numa América racista.

A atuação de Pablo Schreiber é o grande destaque positivo da temporada. Capaz de sair do mero alívio cômico e das piadas práticas, seu trabalho fez de Mad Sweeney um personagem querido e relacionável. É curioso, porque um dos motivos para Neil Gaiman ter forçado a demissão dos showrunners Bryan Fuller e Michael Green foi garantir que a série fosse mais próxima do que foi seu livro. O Sweeney da série tem muito pouco a ver com o seu “irmão de tinta”. E é o que de melhor a série oferece.

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“Ela (a série) fez o que pôde”? Não.

Falando em Gaiman, o autor já está enfurnado em outra produção inspirada em sua bibliografia: “Belas Maldições” estreia no dia 31 de maio (terá cobertura do Plano Aberto, como de costume). Talvez seja o maior indício de que “Deuses Americanos” pode entrar no infame limbo de séries canceladas. A pior parte é que, se for pra continuar assim, não faria falta nenhuma.

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