Sem Rastros

Sem Rastros

A reconciliação familiar pela perda da filha

Claudio Gabriel - 12 de maio de 2021

O início de “Sem Rastros” mostra a viagem de uma família tradicional americana. O pai, a mãe e a filha que vivem em uma aparente harmonia. Os três juntos brincam e conversam em meio a uma ideia da cidade até o campo. Esse elemento apresentado já no início é importante para entendermos depois uma espécie de reconstrução que será necessária ao casal. Por que isso? Pois a filha simplesmente desaparece. Sem saberem o que aconteceu, eles buscam, junto da polícia, tentar entender o que teria acontecido e descobrir as pistas para isso. Esse local novo de perturbação faz com que Wendy (Anne Heche) e Paul (Thomas Jane) percebam que, na realidade, a relação não andava muito bem.

Peter Facinelli consegue construir um clima dramático que abre muitas portas inicialmente. No entanto, o que temos como enfoque de boa parte da narrativa após o desaparecimento é na busca de criar uma tensão e suspense sobre o que teria acontecido. Claro que esse ponto é relevante para o desenvolvimento sobre o casal protagonista. Contudo, nos períodos mais íntimos, em que vemos os problemas que aconteceram ali e as tentativas de se reconciliarem e até não se culparem sobre tudo que aconteceu, é aonde vive o mais instigante do longa.

Esses momentos são espelhados, especialmente, na comparação com um casal que também vai acampar com um trailer nas proximidades. Os dois estão atrás de ter um filho, além de viverem o auge do relacionamento – transando sempre, por exemplo. Miranda (Aleksei Archer) é o ponto central nesse olhar dos personagens principais. Já que ela representa, para Paul, a beleza e toda a paixão que a mulher poderia ter com ele – a cena em que ele vê os dois realizando sexo e tenta com a mulher expressa bem isso. Já a Wendy é uma representação de algo perdido, de um passado quase esquecido com a idade tomando forma do corpo. Nesse sentido, Facinelli até toma cuidado em dar pouco espaço a uma exploração do corpo, já que o mais importante é a sensação que a presença de Miranda passa.

Os momentos de destaque, todavia, acabam bem ofuscados em uma eterna busca sobre a filha. Inclusive, a participação do xerife Baker (Jason Patric) acaba sendo algo até irrelevante, visto que ele apenas reforça uma tentativa de olhar para esse universo como um eterno erro dos pais. Enquanto isso, o discurso de “Sem Rastros” parte muito mais para uma caminho de um novo olhar para o relacionamento de ambos. Eles usam esse período de uma “liberdade” da vida cotidiana, trabalhada desde a primeira cena, como dito antes, de maneira a se reencontrarem.

O filme, ao não saber muito bem para qual lado ir com sua encenação, acaba apenas ficando refém do aproveito inicial curioso sobre seus protagonistas. Desse jeito, dá pouco espaço para uma busca profunda e até um olhar psicológico sobre essa relação. Os momentos mais íntimos, chegam até a lembrar essa relação de busca de novidades com a dor trabalhada por Pedro Almodóvar em “Tudo Sobre Minha Mãe”. Porém, são poucos, já que a produção parece apenas querer reforçar um mesmo elemento de suspense que está presente no DNA da narrativa. E nisso pouco sabe explorar, já que a investigação se torna apenas uma peça de discussões sobre o que teria acontecido com a filha.

Essas questões mostram bem como “Sem Rastros” até consegue saber o que poderia explorar e abrir espaço para discutir. Mas Peter Facinelli transforma a trama em algo muito mais obsessivo sobre pequenas microtramas que aparecem no decorrer do caminho. Desse jeito, é como se o longa tivesse vontade de seguir quase uma fórmula anterior a ele, necessário para ser de um determinado modelo e até acabar de um jeito que apenas reforça isso tudo. Contudo, esse ciclo traz apenas malefícios para interessantes pedaços ali dentro.

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